No meu sotão
Acabei um poema. Provavelmente amanhã estará do outro lado, onde essas coisas se pousam por entre as outras que tal..
Se tivesse um sotão, guardaria lá tudo o que escrevi, só para vê-lo ganhar pó dentro de caixotes de papelão canelado suspensos por teias de aranha ancoradas ao telhado e suspensas elas próprias no segredo da sua geometria. Um lugar onde o mais débil exalar arrancasse minúsculas partículas de pó do seu limbo, para que recomeçassem a dança espiralada que as trouxe até ali e com que assombram até a ciência. Um sotão com cordões de luz de súbito acesos ao espremerem-se por entre as frestas do telhado, como holofotes de um pavilhão de mofo e pó, e onde o inalar daquele ar seria sorver o sossego de uma madrugada estendida no horizonte. Queria sentir o ranger das fibras da madeira de pinho seco e pisado e esquecido estendido a meus pés, ainda que não fosse eu o responsável pela sua derrota, dilatando-se e contraindo-se sob o peso do meu corpo, num suave entoar da melodia escondida na natureza das coisas, mesmo que secas ou pisadas ou esquecidas, e não conseguir perceber se também eu ranjo assim. Da obscuridade fendida escapar-se-iam aromas conservados de outros tempos, que se iriam adsorver por entre as raízes do espírito, substituindo o seu imaterial sustento por aquela imagem de um espaço físico, ainda que incorpóreo, e a torrente avassaladora do mundo entraria por ali adentro sem qualquer resguardo, como no segundo em que nasci. Inundada desse ópio instrumental, a alma esquecer-se-ia de sentir e nessa ante-câmara apócrifa, poderia espreitar incólumemente o que escrevi e poisei em caixotes de papelão canelado, cobertos de pó que dança e vibra na luz e não me fariam lembrar de nada.
Se tivesse um sotão, guardaria lá tudo o que escrevi, só para vê-lo ganhar pó dentro de caixotes de papelão canelado suspensos por teias de aranha ancoradas ao telhado e suspensas elas próprias no segredo da sua geometria. Um lugar onde o mais débil exalar arrancasse minúsculas partículas de pó do seu limbo, para que recomeçassem a dança espiralada que as trouxe até ali e com que assombram até a ciência. Um sotão com cordões de luz de súbito acesos ao espremerem-se por entre as frestas do telhado, como holofotes de um pavilhão de mofo e pó, e onde o inalar daquele ar seria sorver o sossego de uma madrugada estendida no horizonte. Queria sentir o ranger das fibras da madeira de pinho seco e pisado e esquecido estendido a meus pés, ainda que não fosse eu o responsável pela sua derrota, dilatando-se e contraindo-se sob o peso do meu corpo, num suave entoar da melodia escondida na natureza das coisas, mesmo que secas ou pisadas ou esquecidas, e não conseguir perceber se também eu ranjo assim. Da obscuridade fendida escapar-se-iam aromas conservados de outros tempos, que se iriam adsorver por entre as raízes do espírito, substituindo o seu imaterial sustento por aquela imagem de um espaço físico, ainda que incorpóreo, e a torrente avassaladora do mundo entraria por ali adentro sem qualquer resguardo, como no segundo em que nasci. Inundada desse ópio instrumental, a alma esquecer-se-ia de sentir e nessa ante-câmara apócrifa, poderia espreitar incólumemente o que escrevi e poisei em caixotes de papelão canelado, cobertos de pó que dança e vibra na luz e não me fariam lembrar de nada.
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